domingo, 24 de janeiro de 2010

A Hospitalização dos Profissionais

Historicamente, os hospitais foram construídos, intencionados como acolhida para proporcionar atenção a doentes e a peregrinos, durante a Idade Média.

Com o processo histórico o Hospital se tornou efetivamente uma instituição destinada ao atendimento de enfermos, bem como para proporcionar o diagnóstico e o tratamento necessário; sendo que a importância atualmente é possuir uma equipe multiprofissional, confiando-se em todos os profissionais, certo de que todos são importantes: limpeza, diretoria, administração, enfermeiros, médicos, psicólogos, entre outros.

Infaustamente, é escasso o número de psicólogos que trabalham nestas instituições, sendo que o ideal seria, no mínimo, um para cada setor, entendendo a realidade de que todos os setores são amplos.

Na ausência de profissionais contratados as instituições hospitalares geralmente contam com o fervoroso auxílio de novos profissionais integrados à equipe: os estagiários, que entram no campo prático, geralmente desnudando a teoria.

Obviamente que por ser um local em diversidade humana, com pessoas ímpares, e literais pacientes, que mesmo às vezes com semelhantes diagnósticos, são diferentes em intensidade e manifestação. Nisto, é significativo evidenciar que também é distinta a conduta de profissionais; há profissionais e Profissionais.

As instituições hospitalares possuem regras de conduta instruindo-se que todos devem segui-las. Porém as regras são estáticas e não prevê todos os acontecimentos e a intensa atividade humana. Por isso, sempre há, em todos os locais, quebras (ou ressignificações) de protocolos favorecendo interesses, sempre pessoais, e, raramente cumulado a terceiros. Frise-se de que as regras são teóricas e que sua prática criativa e embasada é dificilmente visível.

Havendo vários profissionais ou que teoricamente possuem essa titulação, há uma diferença entre um grupo destes e uma equipe, sendo que esta envolve Comprometimento.


Um grupo de trabalho é a união de duas ou mais pessoas que interagem umas com as outras e dividem algumas tarefas, visando objetivos inter-relacionados. Essas duas características, interação e inter-relacionamento, distinguem um grupo de uma simples união de pessoas. A distinção entre um grupo e uma equipe é importante; todas as equipes são grupos, mas nem todos os grupos são equipes. Um grupo consiste em pessoas que trabalham juntas, mas podem realizar suas tarefas sozinhas; já uma equipe é um grupo de pessoas que não podem realizar seu trabalho, pelo menos não eficientemente, sem os outros membros de sua equipe (Spector, 2006, p. 310-1).


Diante da realidade que se apresenta após casos e casos processuais midiados contra hospitais e profissionais e depois de poucos meses que entrei colaborando para Equipe de Psicologia Hospitalar, esteve sensitiva e praticamente clarividente todo o exposto.

Frente à realidade burocrática hospitalar, as pessoas (profissionais contratados, profissionais- estagiários e pacientes) são apenas números, e não vi de muitos, ou deveria afirmar de alguns dos mais importantes responsáveis, o comprometimento.

Foi como participar de uma propaganda política. No início houve o acolhimento, a expectativa considerando a psicologia como importante. Com o passar das semanas, surgiram boatos dirigidos, em que os psicólogos arrumariam as cadeiras e também auxiliariam a arquivar documentos, pressupondo que, nada ou pouco trabalhavam, ou quem sabe usam o instrumento verbal de forma demasiada e improdutiva.

Meses depois, defronte de uma crise mundial, estagiários comprometidos, desejavam retornar ao trabalho, “antecedendo uma semana da oficial”, sendo que não haveria problemas, pelo contrário, se tornaria enriquecimento aos pacientes, bem como pessoais aos profissionais. Foi perceptível que naquele primeiro dia de retorno, “não comunicado previamente”, o trabalho profissional foi grandioso; eles reencontraram as pessoas dos primeiros atendimentos, das quais possibilitaram favoráveis e surpresos feedbacks, demonstrando o quanto é importante uma escuta profissional. Os pacientes ficaram felizes em revê-los, mas não a equipe. Não puderam continuar nos outros dias. Adiantar uma irrisória semana (sendo que se não fosse a paralização educacional pela crise, seria aquela a semana oficial!) era algo inaceitável. Recentemente como parte da Equipe, mesmo conhecendo os detalhes, não entendi, no momento, o por quê!

Explicaram-me que o hospital não poderia se responsabilizar. Porém havia acordos de compromisso, assinados pelo hospital! Todavia, os estagiários observaram, ainda, rompimento de protocolos (regras), que até então não foram visíveis; regras modificadas, para interesses próprios. Mas não poderiam ser modificados autorizando o TRABALHO PROFISSIONAL por uma semana, pelos dedicados profissionais do estágio?! Alegou-se que não haveria supervisores. No entanto, analisando os fatos, nos papéis da instituição hospitalar alguém assina pela conduta deles! Refletindo para escrever este artigo, revivendo minhas memórias, sim, entendia o porquê: havia falta de comprometimento para com os pacientes que tanto alegres ficaram com o retorno. É obvio que mesmo estando na equipe, contestando e replicando, era inviável; não havia espaço para esta palavra mágica.

Participar daquele impotente momento foi como sentimentalmente analogizar com a seguinte história, aqui criada:


Era como ver duas crianças, irmãos, que numa metáfora, como siameses, e com seus 8 anos de idade, acordam. Estão no campo e olham de dentro de casa pela janela; vêem um céu azul e um brilhante sol, com uma temperatura agradável. Correm para seus pais e perguntam se podem andar de bicicleta pelo terreno. Ambos respondem imediata e simultaneamente que não. As crianças não entendiam; havia um dia lindo, os responsáveis registrados estavam ali. Passou-se aquele dia e não puderam criar, praticar, explorar, se auto-auxiliarem. Todavia, depois de um tempo, perceberam que também foi um momento de aprendizagem. Olhando entre si, observaram que não eram os interesses de seus pais praticarem sua infância, e mesmo por serem oficialmente seus responsáveis, eram profissionais-pais, que não sentiam o comprometimento por eles.


Do mesmo modo, no espaço hospitalar, em lástima, em primeira instância, as pessoas que se interessam, se comprometem, se respeitam e criam o amor, são os pacientes, que aos olhos de muitos profissionais (salvo poucos) devem ser geneticamente pacientes. Aprendi, mas sinto apenas de perceber e presenciar a conduta de muitos contratados e não profissionais, pois foram os contratados que obrigaram dedicados profissionais a absterem-se, por alguns dias, deixando, e possivelmente não reencontrando, os que os aguardavam pacientemente.


sábado, 9 de janeiro de 2010

As Dificuldades das Possibilidades




Quero regressar ao imaginário sem limites.
Tenho saudades dos sonhos a crescer
E da paz da profundidade
De tudo o que é possível.

Tenho saudades de mim,
De querer tudo e sorrir...
A imaginar que sim.
[s.a.]


O Imaginário é uma capacidade, um poder do ser humano, que lhe permite criar situações qualitativas, das quais pode representar sem que tais eventos tenham acontecido (para outrem).

As lacunas do imaginário são preenchidas pelas esperanças, que quando se solidificam pelo desejo humano, se estabelecem naquilo que poderíamos chamar de ilusão.

Ilusão é derivada do verbo latino illudo significando: divertir-se, recrear-se; mas também: burlar, enganar. O verbo latino estava formado pelo prefixo in- e o verbo ludo, "eu brinco". De ludo derivou-se uma ampla família de palavras na qual se inclui "lúdico", relativo a brincar; "eludir", escapar; "alusão", menção, referência; "interlúdio", intervalo num jogo ou representação teatral; e "prelúdio", o que precede uma representação. Em nossa língua, iludir se ampliou com o sentido de causar uma impressão enganosa ou possuir a esperança de algo desejável.

Criar eventos teóricos, mas não praticáveis, são os fatos que até hoje, em meu rol de atendimentos, mais se apresentou. As pessoas, cada qual com seus infinitos motivos, numa tentativa de compreensão, parearam transformando em sinônimos, as possibilidades com as esperanças, isentando-se das pragmaticidade.

Há alguns meses, quando eu estudava um livro sobre oncologia, lá continha um depoimento de uma paciente. Ela dizia que o câncer não passou a ser seu inimigo, mas a palavra possibilidade, pois na sua forma de compreender, a possibilidade de todos os eventos acontecerem, possibilitou a sua situação oncológica. Sim, isto é fato.

Teoricamente, a possibilidade é escrita e transmitida aos seus leitores como algo iluminado. Compreender que as pessoas são seres de todas as possibilidades se faz pensar o quanto grandiosas e divinas são as criaturas humanas. Ninguém não é magnificente; todas as possibilidades não são aquilo que desejamos e esperamos, mas o que universalmente estamos dispostos a praticar e, se for o caso, a receber (de nós mesmos).

Com isso, observa-se que as possibilidades possuem suas aparentes e ilusórias dificuldades, que podem ser assim compreendidas pelo imaginário do ser humano. No caso oncológico, e.g., devido ao sofrimento e o estigma do câncer, a pessoa experienciou uma das possibilidades de nossa atualidade e do universo. Porém, é importante aludir que, toda a possibilidade é algo que pode ser benéfica ou maléfica, depende dos seus repertórios de valores educacionais, compreensíveis e amorosamente inventados. Todas as situações, até mesmos as mais difíceis e sofríveis, são oportunidades (possibilidades) de se aprender, e também de criar eventos paralelos – bons ou ruins, porque um desses adjetivos apenas existe na presença irrevogável do outro.

Portanto, no momento em que o homem inventou a porta, criou a possibilidade de que as pessoas passem por ela, mas que também fossem por elas jogadas.





OBS.: Anterior a esta data, este espaço psicopragmático era nomeado Life Prostitute: A Prostituição do Conhecimento; ainda existente em sua essência.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Senhores Deprimidos

Muitos seres devem saber, por experiência, que é difícil participar de lugares sociais que não sejam totalmente domados pela prostituição instituída, principalmente em vilarejos.

Uso com sarcasmo o verbete vilarejo. Uma das teorias é que o termo deriva-se do grego referindo-se aos aldios e aldias, ou seja, aldeãos e aldeãs; eles eram uma espécie de semi-servos, porém recuperaram quase totalmente sua liberdade; mas, o sarcasmo advém do fato de muitos se viver em vilarejos atualmente, sendo totalmente servos e sem nenhuma liberdade, acreditando que a tem. “Quando você é jovem, tudo parece o fim do mundo, mas não é. É só o começo”.

Nos vilarejos do interior ou metropolitano, a inexata idéia de liberdade e de pura escravidão é fantasticamente constatada nas danceterias, raves, pvts e festas diversas, onde o consumo exacerbado de álcool e drogas naturais ou sintéticas está alarmante causando preocupação de saúde pública.

O alcoolismo é comumente definido para pessoas que tenham um consumo consistente e excessivo de produtos que contenham o álcool, que também possuem conflitos no ambiente social e na saúde emocional, e até mesmo uma predisposição genética para ocorrência do fato. Tal manifestação sempre interfere acentuadamente na vida pessoal, familiar, social e profissional da pessoa causando alterações psíquicas e físicas, bem como paralisação dos sinais vitais por diversas condições consequenciais diretamente do abuso alcoólico.

Além do álcool, existem outras drogas. Elas estão classificadas em três categorias: as perturbadoras, as estimulantes e as depressoras; todas relacionadas às ações mentais. O termo é amplo e envolvem barbitúricos, tranquilizantes, alucinógenos, estimulantes e analgésicos, bem como o citado álcool e demais substâncias de fácil acesso, podendo ser naturais ou sintéticas.

Em geral, drogas (também conhecidas como entorpecentes e narcóticos) são termos que se referem às químicas que geram modificações nos sentidos, em que as psicotrópicas, molestam o Sistema Nervoso Central (SNC), alterando as faculdades comportamentais e psíquicas.

Por aproximadamente quatro anos, acompanhei um grupo de dependentes químicos. Foi uma contribuição mútua. Em seus relatos, podíamos observar, juntamente com seus sentimentos, a alienação causada pelos componentes químicos. Todos podiam relatar suas experiências, sejam elas pessoais ou profissionais. O dialogar imperava e auxiliava no suporte psíquico. Ali participavam os adictos, familiares, acompanhantes, os coordenadores e o público em geral interessado na temática. Em sua maioria, eram pessoas consideradas pela sociedade, como ignorantes, todavia eu não as substituía por um tratado médico; este apenas me auxiliava como complemento. Possibilidades diversas nós compartilhamos e as aproveitamos.

Como relata uma música internacional, “[...] os tigres vêm à noite, com sua voz baixa como o trovejar [...]”, e geralmente, é à noite que os tigres químicos vêm, com sua voz persuasiva, encantando, os adios e adias que se dizem modernos. Ainda escravos, estes visitam casas noturnas (ou até mesmo diurnas), apenas para comparecerem e se exibirem; alienados, também pelo hedonismo, não se sentem, são desprovidos de atividades mentais regulares e não criam seus próprios espaços; unicamente, caminham como autômatos programados, dispensando possibilidades de práxis existenciais, em outras localizações em que possam usá-los adequadamente para criar diálogos como senhores fidedignos de existência, e não como subservientes de indiferentismo moral, político, sócio-cultural e intelectual, isto é, promovidos com distração.

Nestas situações de existência que impera na sociedade, agora instruídos por Facundo Cabral – compositor, cantor e escritor argentino –, lembre-se que


Não estás deprimido, estás distraído. Distraído em relação à vida que te preenche. Distraído em relação à vida que te rodeia: golfinhos, bosques mares, montanhas, rios. Não caias como caiu teu irmão que sofre por um único ser humano, quando existem cinco mil e seiscentos milhões no mundo. Além de tudo, não é tão ruim viver só. Eu fico bem, decidindo a cada instante o que desejo fazer, e graças à solidão [...] Não faças o que fez teu pai, que se sente velho porque tem setenta anos [...] Não estás deprimido, estás distraído. Por isso acreditas que perdeste algo, o que é impossível [...] Além disso, a vida te tira coisas: te liberta de coisas. Alivia-te para que possas voar mais alto, pra que alcances a plenitude. Do útero ao túmulo, vivemos numa escola; por isso, o que chamas de problemas são apenas lições. Não perdeste coisa alguma [...] Não existe a morte... apenas a mudança [...] Não faças coisa alguma por obrigação ou por compromisso, apenas por amor. Então terás plenitude, e nessa plenitude tudo é possível sem esforço, porque és movido pela força natural [...] Reconcilia-te contigo, coloca-te frente ao espelho [...] e decide neste exato momento ser feliz, porque a felicidade é uma aquisição. Aliás, a felicidade não é um direito, mas um dever; porque se não fores feliz, estarás levando amargura para todos os teus vizinhos. [...] Podemos experimentar a neve no inverno e as flores na primavera, o chocolate de Perusa, a baguette francesa, os tacos mexicanos, o vinho chileno, os mares e os rios, o futebol dos brasileiros, As Mil e Uma Noites, a Divina Comédia, Quixote, Pedro Péramo, os boleros de Manzanero e as poesias de Whitman; a música de Mahler, Mozart, Chopin, Beethoven; as pinturas de Caravaggio, Rembrandt, Velázquez, Picasso e Tamayo, entre tantas maravilhas. [...] Não estás deprimido, estás desocupado. [...] Ama até que te tornes o ser amado; mais ainda converte-te o próprio Amor. [...] O bem é maioria, mas não se percebe porque é silencioso. Uma bomba faz mais barulho que uma carícia, porém, para cada bomba que destrói há milhões de carícias que alimentam a vida [...]

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