domingo, 24 de outubro de 2010

A Scientia Sexualis e as Habilidades e Competências nas Relações Institucionais: Seu Problema, Nossa Consequência

Sobre habilidades e competências muito se teoriza, todavia pouco se compreende efetivamente. Habilidade é a capacidade de receber impressões, assimilar ideias, analisar, raciocinar, entre outros, e, é construída de acordo com o desenvolvimento humano; são condições a priori ao ato. A Competência, por sua vez, é o ato, a ação, é uma condição a posteriori da habilidade. Deste modo, por exemplo, se não possuo habilidades motoras desenvolvidas que me permitam dançar – a priori –, não atingirei uma ação competente para dançar – a posteriori. Por isso, em todos os ambientes em que se encontram pessoas, temos que trabalhar com o que já se possui: pensar e praticar a habilidade para atingir o resultado competente; e, se for o caso, desenvolver novas habilidades, ou aperfeiçoar as já existentes, para se alcançar outras competências ou adquirir maior grau nas atuais. Frise-se que, às vezes, nem todas as habilidades podem ser desenvolvidas em uma única pessoa; as habilidades, mais que as competências, são dependentes de condições psicofisiológicas.

Todos os setores institucionais, de algum modo trabalham com o pensamento de habilidades e competências. No entanto, elas são amplamente discutidas com mais intensidade nas linhas de montagens educacionais: as Instituições Escolares. Nestas, vive-se a indecência de se forçar desenvolver sem compreender, respeitar ou relacionar adequadamente; nelas todos os educandos deverão ao final da linha de montagem (séries escolares) possuir o mesmo nível de conhecimento, sendo este pré-estabelecido. Onde se encontram as singularidades das identidades e o respeito pelas diversidades culturais e intelectuais? Deveriam se complementar neste espaço! Porém, alguns educadores esquecem-se, eximindo-se do processo, de que nem eles próprios possuem todas as habilidades e competências, portanto, isto justifica o fato de muitos não compreenderem o desenvolver do Outro – profissional e/ou educando – gerando-se conflitos intensos.

Um tema de intenso debate educacional é o que se refere ao Sexo e Sexualidade. Escolas já afirmaram que sobre isto nada ou pouco pode ser mencionado. Todavia, é o que mais os educandos desejam saber e compreender, pois, estamos numa sociedade sexual – a mídia, por exemplo, já entendeu que para haver consumo o produto tem que se apresentar como sexy conquistando o consumidor, além do que, em nossa sociedade o sexo também se igualou ao conceito de entretenimento.

Em 1988, a TV norte-americana ABC produziu a série The Wonder Years. Esta apresentou questões sociais e eventos históricos do final da década de 1960 e do início dos anos de 1970, através do ponto de vista do protagonista, oferecendo ainda uma trama de problemas familiares e dados sobre a adolescência – conflitos, dúvidas, conquistas e a principal informação: que os anos adolescentes foram incríveis. Houve histórias de atração e sexo, mas eram mínimas, conscientes e responsáveis. Em 2010, a TV norte-americana MTV está apresentando a série The Hard Times of RJ Berger, evidenciando a vida atual de adolescentes em uma escola, sendo que a competência a ser atingida pelos alunos é o ato sexual, e detalhe: além dos discursos, os pais e responsáveis dos juvenis também são sexualizados; e, a adolescência, é considerada como terrível. A Revista Época publicou na capa da edição n. 624, de 01 de maio de 2010, a imagem de uma caixa de remédio sendo que este medicamento se chamava Sexo, com a seguinte manchete: “O Ministério da Saúde recomenda: Faça Sexo!”. Então, nos últimos 20 anos esse tema tem sido potencializado; “[...] vivemos numa sociedade em que a sexualidade é estimulada em termos de atrativos físicos e do ‘bom’ desempenho no ato sexual” (Picazio, 1998, p. 15), e também pelo fato do sexo ter sido objeto de estudo científico, assim novas descobertas são feitas e divulgadas, já que estamos na Era da Informação. “O homem ocidental aprende pouco a pouco o que é ser uma espécie viva num mundo vivo, ter um corpo, condições de existência, probabilidade de vida, saúde individual e coletiva, forças que se podem modificar, e um espaço em que se pode reparti-las de modo ótimo” (Foucault, 2005, p. 134). Entretanto, muita informação e pouca compreensão.

“A história da sexualidade se quisermos centrá-la nos mecanismos de repressão, supõe duas rupturas. Uma no decorrer do século XVII: nascimento das grandes proibições, valorização exclusiva da sexualidade adulta e matrimonial, imperativos de decência, esquiva, obrigatória do corpo, contenção e pudores imperativos da linguagem; a outra, no século XX; menos ruptura, aliás, do que inflexão da curva: é o momento em que os mecanismos da repressão teriam começado a afrouxar; passar-se-ia das interdições sexuais imperiosas a uma relativa tolerância a propósito das relações pré-nupciais ou extramatrimoniais; a desqualificação dos perversos teria sido atenuada e, sua condenação pela lei, eliminada em parte; ter-se-iam eliminado em grande parte, os tabus que pesavam sobre a sexualidade das crianças” (Foucault, 2005, p. 109).

No desenvolvimento púbere-adolescente, que atualmente está em todas as idades, se nota comportamentos e ações psicológicas de crianças-adolcescentes, adolescentes propriamente ditos e adultos-adolescentes – observe os designs e designers da moda que são em sua maioria teen e/ou sexy – e o tema Sexo e Sexualidade se tornou o ápice para o reconhecimento de suas habilidades sexuais singulares e para a criação das competências sexuais ímpares, sendo hoje uma situação de preocupação pública e social com referência à saúde humana em seus vários meios de estudo devido aos mitos, tabus e preconceitos existentes.

À vista disso, com a criação do termo Adolescente, e com o tempo, o historiador Philippe Áriès (1981, p. 15) já afirmou que “a adolescência expandiria, empurrando a infância para trás e a maturidade para frente [...] Assim, passamos de uma época sem adolescência a uma época em que a adolescência é a idade favorita. Deseja-se chegar a ela cedo e nela permanecer por muito tempo”. Ela é a representação, o símbolo da juventude, da beleza e do vigor humano.

Então, se esse tema não for desenvolvido nas escolas, neste público adolescente, independente da idade, mas dependente de metodologia adequada, há uma possibilidade maior que os educandos, por ausência de entendimento, amplifique os problemas de saúde pública relacionados ao sexo, e ainda, não compreenderão o conteúdo teórico-prático. Por quê? Pelo fato de haver um congestionamento no tráfego de informações, semelhante ao de automóveis nas metrópoles. As informações sexuais, hoje ampla e sutilmente divulgadas ficam estagnadas aguardando compreensões para serem organizadas, nisto o conteúdo em aula passa a ir para o final da fila ou nem isto consegue. E, também, já que “a adolescência é uma época em que os jovens criam e reformulam conceitos, principalmente os relacionados à sexualidade, se não souberem distinguir mitos, tabus, e preconceitos, podem incorrer no erro de adquiri-los como normas de vida, impossibilitando as alternativas mais saudáveis para que a vida afetiva sexual” (Picazio, 1998, p. 97).

Exemplo disso foi uma Conferência realizada numa escola do interior paulista, a pedido informal da instituição, sobre a temática, e foi denominada Sexo e Sexualidade: Uma Conversa Sexy. Os alunos do sexto ao nono anos foram requisitados em saber se possuíam interesse em conversar com psicólogos sobre o assunto. Imediatamente seus olhos se espantaram e abrindo um sorriso de alívio, surpresa e culpa, responderam afirmativamente. Suas dúvidas de forma sigilosa, sem a exposição de ninguém, foram recolhidas, subtematizadas e organizadas. Em dez salas do Ensino Fundamental deveriam ter sido aplicada, porém foram trabalhadas em apenas quatro salas, porque uma semana depois do início das atividades houve reclamações. Na data do evento, que os alunos aguardavam ansiosamente pela continuidade, os responsáveis pelos trabalhos foram comunicados que o trabalho deveria ser reformulado ou cancelado, pois o aspecto sexualidade e sexo anal – que eram dúvidas dos educandos – não poderiam ser abordados, já que as reclamações foram em tese, de acordo com as informações, de educadores religiosos. Nisto, entende-se que “[...] há coisas que se pode fazer, mas das quais jamais se pode falar. Ou melhor, há coisas que não convém fazer, mas pecado maior do que fazê-las é dizer-se que as fez. No silêncio, [acredita-se, que] as coisas não existem; se existiram, deixam de existir. A ação é tolerável, compreensível, até mesmo lícita. Mas a verbalização dela é reprovável, inadmissível [...]” (Nahoum apud Nunes, 2007, p. 63).

A curiosidade e o interesse dos educandos, que tanto se requisita, foram obscurecidas. “Desejar é ter vontade de, é querer ter, é curiosidade. A sociedade, em nome da moral e dos bons costumes, determina como as pessoas devem obter prazer na vida. O desejo de experimentar o sexo anal está associado à vontade de transgressão, a um desejo secreto de saber como é esse tipo de sexo, condenado por esses costumes morais e religiosos em nosso país, porém não é ilegal” (Nunes, 2007, p. 31).

“Parece que, por muito tempo, teríamos suportado um regime vitoriano e a ele nos sujeitamos ainda hoje. A pudicícia imperial figuraria no brasão de nossa sexualidade contida, muda, hipócrita. [...] A sexualidade é, então, cuidadosamente encerrada. Muda-se para dentro de casa. A família conjugal a confisca. E absorvê-la, inteiramente, na seriedade da função de reproduzir. Em torno do sexo, se cala. O casal, legítimo e procriador, dita a lei” (Foucault, 2005, p. 9).

E ainda referenciando aos protestos, “é comum considerar o sexo anal como relação praticada sempre entre os casais homossexuais, em relacionamentos sem compromisso ou com profissionais do sexo. Isto não é verdade. Poucas pesquisas têm sido feitas sobre esse assunto – sexo anal –, porém todas demonstram que, cada vez mais, casais heterossexuais fazem sexo anal e, muitas mulheres estão sentindo prazer intenso com essa relação. [...] O nosso dever é dar condições de informações sobre todas as formas de relações sexuais, assim como o fazemos com os métodos contraceptivos, que também estão deficientes de informação” (Nunes, 2007, p. 17-9).

As reclamações geralmente ocorrem em até três níveis: social, profissional, pessoal. A conferência possuía amparo legal e metodológico, tanto social quanto profissional, portanto, não havia argumentações que a impedissem. Então, a reclamação foi pessoal. Nesse sentido há equívocos. As instituições escolares trabalham com a diversidade e as condutas da comunidade escolar devem possuir respeito para com a diversidade de identidades e para com as informações. Isto não aconteceu; e, era adequado que houvesse uma reunião para discutir o assunto, sem prejuízo ao trabalho psicológico, todavia, os protestos, já eram julgadores e definitivos. Não houve comunicação, e sim, uma sweet e sutil sentença.

Frise-se que “somos diferentes um do outro, como cores diversas que podem se complementar de maneira harmoniosa. Heterossexuais, homossexuais e bissexuais são pessoas desejosas, todas elas, de expressar o seu amor. Compreender essa diversidade não significa aceitá-la como o caminho a seguir, porém tolerá-la como parte da existência humana. Falar sobre as diferentes manifestações sexuais não é um caminho para praticá-las, mas para exercer a sexualidade com respeito pela própria natureza e pela dos outros” (Picazio, 1998, p. 17). Apesar disso, entende-se que, “se o sexo é reprimido, isto é, fadado à proibição, à inexistência e ao mutismo, o simples fato de falar dele e de sua repressão possui como que um ar de transgressão deliberada. Quem emprega essa linguagem coloca-se, até certo ponto, fora do alcance do poder; desordena a lei; antecipa, por menos que seja, a liberdade futura. Daí essa solenidade com que se fala, hoje em dia, do sexo. Os primeiros demógrafos e os psiquiatras do século XIX, quando tinham que evocá-lo, acreditavam que deviam pedir desculpas por reter a atenção de seus leitores em assuntos tão baixos e tão fúteis (Foucault, 2005, p. 12).

Pelas informações comunicadas na Instituição onde se aplicou a conferência, em tese, afirmaram alguns educadores que os alunos não precisariam ficar sabendo do cancelamento do trabalho e que os coordenadores da conferência não precisariam informá-los da decisão. Mas, por educação e respeito pelo outro eles foram comunicados, sem se culpar ninguém. Eles ficaram irritados com a notícia, porém comunicá-los, ameniza conflitos; ameniza, mas não extingue. Portanto, há a possibilidade de haver uma amplificação de conflitos relacionais e comunicacionais, potencialização de violência física, verbal, psicológica, cultural, prejuízo ao patrimônio escolar, e, entre outros, problemas familiares, sociais, gravidez e até mesmo Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) levando a evasões e diminuindo os índices escolares.

“O que é próprio das sociedades modernas não é o terem condenado o sexo a permanecer na obscuridade, mas sim o terem-se devotado a falar dele sempre, valorizando-o como o segredo” (Foucault, 2005, p. 36). Assim, cancelando a conferência, e enterrando-o como segredo, valorizando-o como relíquia, o que ocorre? Uma caça ao tesouro; trilhas são criadas e marcas são deixadas.

“Consideramos os colégios do século XVIII. Visto globalmente, pode-se ter a impressão de que aí, praticamente não se fala em sexo. Entretanto, basta atentar para os dispositivos arquitetônicos, para os regulamentos de disciplina e para toda a organização interior: lá se trata continuamente do sexo. [...] O que se poderia chamar de discurso interno da instituição – o que ela profere para si mesma e circula entre os que a fazem funcionar – articula-se, em grande parte, sobre a constatação de que essa sexualidade existe: precoce, ativa, permanente” (Foucault, 2005, p. 30).

As instituições escolares, em sua maioria são autografadas por riscos e rabiscos, isto é, mensagens, pois se os educandos não são ouvidos, eles marcam e pressionam a serem escutados. Quando consequências acontecem as escolas estremecem, são como placas tectônicas em movimento, o que gera conflitos, confusões e gritos. Os habitantes do local gastam tempo e energia para se equilibrarem, por fim, expressam-se cansados.

A conferência era um pacote de discussão, informação e consciência que ia além do próprio tema, propondo ainda em evidência e com sutilidade: planejamento familiar, responsabilidade e respeito para com o Outro, valores sociais e familiares, comprometimento com as atividades escolares e para “salientar a importância das relações afetivas, bem como estar aberto à comunicação pessoal. Ajudar nossos alunos e filhos a compreender os comportamentos sexuais. Ensiná-los a valorizar a saúde. Compreender a nossa cultura, seus limites e seus direitos” (Picazio, 1998, p. 14). Alguns agentes institucionais se queixaram do tema, mas a importância está em como ele é desenvolvido e transmitido. Por consequência, em resposta, os educandos, ao final, preenchendo voluntariamente questionário, afirmaram:

- “Eu achei esse trabalho muito bom, tirou todas as minhas dúvidas. Obrigada por dar essa aula aqui.”
- “Foi muito bom e adorei. Eu não sabia disso que eles ensinaram. Foi interessante.”
- “Eu gostei muito. Bom trabalho.”
- “Muito bom, porque mostra as doenças perigosas.”
- “Eu gostei de saber sobre as doenças.”
- “Esse trabalho foi para ensinar todos.”
- “Vocês responderam claramente e ajudou muitas pessoas; eu tenho certeza. Vocês estão de parabéns!”
- “Eu achei muito legal o trabalho dos psicólogos.”
- “Vocês são ótimos psicólogos, a gente aprendeu muito mais. Obrigado.”
- “Eu quero outra aula porque eu gostei muito.”
- “Eu achei essa orientação ótima; pois todos aprenderam algo. Eu não tenho nem uma crítica contra o que eles disseram. Explicaram bem.”
- “A palestra sobre sexo foi muito importante, tirei muitas dúvidas sobre o assunto.”
- “Eu achei isso muito bom para a gente ficar consciente.”
- “Essa palestra foi muito importante porque está ensinando, ou melhor, avisando as pessoas não conscientes.”
- “Eu gostei, pois eles ensinaram muitas coisas para me proteger e para várias pessoas também.”
- “Achei muito bom, falaram coisas que no cotidiano não sabemos.”
- “Foi muito importante, porque outras pessoas só falam besteira”.
- “Foi muito legal, explicaram e responderam todas as minhas dúvidas. Se não fosse isso eu acho que nunca saberia. Eu já tive várias palestras, mas essa foi a melhor e deu detalhes importantes.”
- “Vocês estão de parabéns. Foi muito interessante. Continuem assim! Ajudaram-me muito!”
- “Eu achei um bom o trabalho, excelente. Eles podem continuar com esse trabalho.”

Antes de o trabalho ser interrompido, 101 alunos, de 6º e 7º anos conseguiram participar da conferência. Destes, 96 responderam ao questionário: 82,29% consideram o trabalho interessante e importante para suas vidas. O restante, 17,71%, considerou como razoavelmente, por já possuírem conhecimento, sendo que outros ainda não sabiam afirmar, no momento, sobre a importância, porque eles estavam organizando as informações, visto que as pessoas somente captam informações que são condizentes com seu desenvolvimento psicossocial – portanto, não sendo o trabalho prejudicial; e, 97,92% afirmaram que o desempenho dos psicólogos ficou entre Bom e Muito Bom.

Os protestantes e a instituição não previram nem discutiram os possíveis benefícios e consequências. O tema, Sexo e Sexualidade se tenta camuflar, silenciar. Porém, ele está em todos os lugares, e como escreveu o escritor português, José Saramago: “não se ganham batalhas de hoje com armas de ontem”. Enfim, a própria escola solicitou o tema; cancelou, e subliminarmente afirmou: “problemas deles”. No entanto, o problema pode até ser deles, mas as ações desses problemas – as consequências – são de todos nós. Imagem clássica disso é a economia mundial, pois quando acontece alguma crise em algum país de potência, todos os outros são influenciados. Existimos numa teia, o que acontece num ponto é amplificado gradativamente.

Em tal caso, aos nobres julgadores, das diversas instituições existentes no mundo, um recado poético: “se mergulharmos um copo num oceano e nós o olharmos e ele não contiver peixe, qual a nossa conclusão? Seria de que não há peixe no oceano? Ou de que é o oceano muito vasto e nosso copo não contém uma boa amostra dele? Sequer olhamos. Mal começamos a procurar. Devemos fazer um trabalho muito melhor antes de tirarmos conclusões extraordinárias!”

Cada ente se desenvolve e se amplia como uma enciclopédia; esta contém informações diversas e muitas vezes conflitantes. Porém, ao se ampliar excessivamente, sem compreensões ou com entendimentos equivocados, muitos resolvem se particularizar e criam o seu próprio livro; alguns o chamam de Diário, Autobiografia, Orkut, Facebook, My Space, entre outros. É aí que muitas vezes podem se encontrar as “conclusões extraordinárias”, pois muitos criam seu próprio livro e o consideram como a Verdade, excluindo-se muitas informações. Quando se valoriza demasiadamente um único livro, isto é, o seu, se esquece da enciclopédia. Pertencer à enciclopédia ou ser uma extensão ainda vinculada a ela permite que as pessoas não percam a consciência da diversidade (de informações) e de como compreendê-la e com ela trabalhar.

“Dessa maneira, a educação poderia deixar de ser esta farsa onde cada um tem do outro uma imagem mais ou menos falsa e seria facilitada à medida que o educador soubesse enriquecer sua personalidade. Em última análise, repropomos a cultura interior da personalidade, o cultivo do eu pelo eu. O educador pode alcançar este resultado por meio de uma higiene intelectual e de uma disciplina afetiva tais, que se pode chegar a dizer que cuidar do educador é muitas vezes, a melhor solução do problema [(...); principalmente porque ele] não soube evoluir com seu tempo para se colocar no lugar do jovem que hoje tem diante de si. Se despreza os jovens, é porque tem saudades de sua própria juventude. Daí para a acusação de inveja, não há senão um passo. É-lhe necessário depreciar, por despeito, nos outros, esta juventude que não reencontrará jamais. Além disso, por falta de coragem, por medo do ridículo, por preguiça de espírito e de coração, ele se recusa a frequentar os jovens, a viver sua vida. É por isso que os conhece de fora, [...] a advinha-los através de jornais e de livros. Podemos assim verificar que, quanto mais o educador envelhece na carreira, mais ele está ameaçado de uma esclerose sentimental que o impede de se renovar. [...] As relações entre o educador e o adolescente se orientam, então, para a hostilidade e para uma agressividade cada vez mais acentuada. Quanto mais o adulto despreza o jovem, mais este último reage com vigor, distinguindo-se por sua atitude de negação. Frente ao adulto que não o compreende, o adolescente diz ‘não’ à sua moral, ‘não’ a sua experiência. Exagerando mesmo sua atitude de oposição, busca o escândalo, acusando o adulto, mais ou menos injustamente, de traição e comprometimento. Seus propósitos desabusados e sua atitude agressiva não são senão uma espécie de movimento de defesa contra os costumes que o chocam. Por reação, chega até a estragar sua vida, de propósito, para ‘aborrecer’ os que pretendem moralizá-lo. Ao contrário, esta oposição desaparecerá se o adulto consentir em descer de seu pedestal e abandonar seu conforto para caminhar um pouco com os jovens. Reconhecemos que esta experiência não é fácil. Não abordamos os jovens como se representássemos a perfeição moral e intelectual. Eles se sentem, pelo contrário, bem mais próximos quando descobrem, em nós, esta espécie de inquietação dos seres que não se julgam perfeitos e que buscam seu caminho com lucidez e simplicidade. O grande erro é se aproximar dos jovens para viver com eles, mostrando-lhes uma atitude predicante moralista que, incansavelmente nos leva a repetir: ‘É preciso fazer isso, é preciso fazer aquilo; olhe para mim, faça como eu’, tudo isso acompanhado de mil preceitos morais. Eles, então, perdem imediatamente a confiança. Rapidamente nos desmascaram com sua intuição, sua sutileza extraordinária, sua acuidade psicológica que põem a descoberto nossa hipocrisia” (Marchand, 1985, passim).

“A maior falha de qualquer processo educacional é querer domesticar os educandos, acomodá-los, fazê-los repetir o professor ou os pais, impedindo-os de criar, tornando-os meros repetidores ou armazenadores de conserva cultural. Educar é desenvolver uma consciência crítica que permite ao homem transformar a realidade. Na medida em que respondem aos desafios do mundo criativamente, constroem sua própria história” (Baptista, 1998, p. 175).

À vista disso, como aprendemos e convivemos com valores, disciplinas escolares e informações gerais em todas as Instituições? Ora, é através da compreensão do sistema de comunicação relacional advindos dos códigos-mensagens (aspecto de práxis), que na atuação são as habilidades e competências (aspecto prático). Todavia, para compreender, as informações, elas devem ser respeitadas, organizadas e manifestadas com objetivos coletivos. “Se o homem é ignorante, torná-lo sábio é educar. Se o mundo é injusto, torná-lo justo é educar. Porque o mundo não se reforma por estruturas que os homens inventam e eles mesmos corrompem. O mundo só se reforma pela reforma do homem um a um” (Bittencourt apud Picazio, 1998, p. 13).


sábado, 28 de agosto de 2010

Ita Missa Est: A Senha do Desenvolvimento Empresarial

“Qual o objetivo de seu trabalho?” Esta é uma das indagações mais importantes que meu trabalho faz para o trabalho de outros; todavia, existem poucos trabalhadores (que possuem anuência) para explorar possibilidades de respostas. Se a investigação fosse aceita, as funções poderiam ser potencializadas para um planejamento funcional mais efetivo, ou seja, para uma situação distinta do que encontro em muitos ambientes trabalhistas.

O mundo psicossocial move-se ao redor de um eixo-composto e central: os códigos-mensagens. Criamos e reproduzimos códigos que ao fazer parte de relacionamentos e comunicações se transformam em mensagens.

A Psicologia Empresarial, conhecida também como Organizacional e do Trabalho ou Gestão de Pessoas é uma ciência que estuda os processos mentais (sentimentos e cognições) e os comportamentos e aplica as informações, já reelaboradas, sobre as relações interpessoais bem como em programas de desenvolvimento que visem sempre à melhoria no espaço onde se trabalha, além dos interesses dos empreendedores. A Psicologia está vastamente ligada às empresas atualmente, seja para o bem-estar de cada um dos colaboradores e até mesmo nas emoções geradas num ambiente de trabalho, organizando e desenvolvendo-o.

A prática da psicologia organizacional é como uma cozinha repleta de ingredientes em que se elaborariam muitos pratos, caso fosse permitido aos cozinheiros inovar e experimentar juntamente com as atividades psicológicas. Porém, há uma insistência nas empresas, de todos os ramos, em apenas reproduzir uma receita.

Entretanto, tal “ato culinário” é de responsabilidade ampla. Então, continuando a utilizar a analogia: numa cozinha existe o Chef, Souschef, Chef de Partie, Aboyeur, Boucher, Entremmétier, Guarde-Manger, Légumier, Patissier, Poissonier, Potagier, Rôtisseur, entre outros cozinheiros e assistentes que no conjunto são considerados como uma Equipe. Ocorre que esta, por exemplo, e equipes de outros setores se consideram como reprodutoras de atividades no sistema de trabalho. Recordo-me de vários funcionários, em muitos lugares, que se julgavam como pessoas que não possuíam conhecimento, e as informações que já possuíam não eram utilizadas para construir planos e ações. Logo, optavam pela “reprodução de receitas”. Acontece que é uma ação de responsabilidade ampla! O Chef não percebia o código da equipe de pessoas, e por sua vez, as pessoas da equipe, os cozinheiros e assistentes, não compreendiam os códigos do Chef; não havia mensagens, já que não se estabeleciam relacionamentos e nem comunicação adequados com os integrantes do conjunto no ambiente de trabalho. O procedimento adotado nestes casos é a Inércia.

De modo geral, afirma-se que o ambiente organizacional nutre a sutil ideia de que o trabalho é algo que não deve ser compreendido, pois cada funcionário deve ir trabalhar e tentar compreender (o que não lhe é permitido entender); assim, isto faz com que ele trabalhe, execute ações e tenha a sua frustrante ocupação na sistemática organizacional. Ao final do dia, continuando a possuir informações que não entende, a probabilidade é maior de ocorrer uma estabilidade no emprego. Na reprodução de atividades, crê-se apenas que a incompreensão gera uma manutenção do cargo e que essa fantasia de conservação é proveitosa. Pensa-se exclusivamente no cargo; excluem-se as atitudes.

À vista disso, a posição da sistemática organizacional atual é equivocada. Muitas organizações e pessoas elaboram informações que são descartadas, como resíduos, pelo simples fato de haver um abandono dos códigos-mensagens, o que gera obstáculos para um desenvolvimento triunfante. Em minha experiência, àqueles resíduos contém instigantes informações para a elaboração de muitas propostas/práticas. Portanto, conheça o código, manuseie as informações e crie.

“Qual o objetivo de seu trabalho?” – convenientemente insisto em questionar. Possivelmente as respostas estão em códigos e às vezes você tem que (se) permitir olhar intensamente para enxergar o seu valor e o que ele transmite. O segredo da estabilidade e o desenvolvimento organizacional é o código humano. Ita missa est. Nesse caso, decifre-se.


*Artigo publicado originalmente no Jornal Tribuna Regional, 14 ago. 2010.


sábado, 21 de agosto de 2010

Você e Eu: Uma Comunicação Psicopedagógica

A sociedade existe através dos conhecimentos criados e adquiridos por àqueles que a constitui, isto é, as pessoas. Neste processar encontra-se uma das atuais profissões que é de importante destaque: a Psicopedagogia.

Um psicopedagogo não se refere àqueles profissionais que adquiriram o conhecimento da Psicologia e da Pedagogia e os fundiram. Apesar deste equívoco em sua compreensão, o profissional da Psicopedagogia surgiu justamente para atentar-se a compreensão do comportamento humano no processo de ensino-aprendizagem.

Pode parecer comum, ou até mesmo uma atividade supérflua, mas a todo o momento estamos aprendendo e ensinando. Eis a importância de se refletir pragmaticamente sobre o que se aprende e o que se ensina.

Aparentemente o psicopedagogo somente se encontra nas instituições escolares. Todavia, ele atua também em diversos campos como nas empresas, hospitais e clínicas atendendo os indivíduos e as famílias. “Por quê?” Numa empresa, apenas como menção, ocorrem diversas situações em que as pessoas necessitam de um desenvolvimento aprimorado em seu trabalho. O psicopedagogo atua auxiliando nesse processo para que este seja adequadamente ajustado às condições do funcionário, gerando benefício a ambos – empregador e agente –, agilizando as tarefas funcionais e, em consequência, evitando-se conflitos que poderiam emergir de uma inadequada relação e/ou comunicação, sendo estas, atualmente, uma das dificuldades do seres humanos.

Mencionando este fato, o relacionar e o comunicar são algumas das mais importantes ferramentas que as pessoas possuem para conectar-se com o Outro, estando praticamente inerentes aos atos de aprender e de ensinar.

Ao se observar o desenvolvimento do ser humano, o mesmo necessita de pessoas que o amparem sendo que elas estão nos principais meios: a família, a escola e a sociedade. São nestes ambientes, muitas vezes simultaneamente, que cada pessoa participa com suas variadas condutas, pensamentos e emoções. Os ensinamentos e as aprendizagens que esta trindade proporciona são como o líquido encefálico que num continuum nutrem e constituem o ser humano.

Compreende-se que o que você pratica advém do que você aprendeu e pelo que você se interessou em conhecer, porém é também o que você ensina. Lembro-vos que você aprendeu e sentiu muitas coisas, mas há a possibilidade de que não se importou com elas. Você aprendeu a caminhar, a andar de bicicleta, a escrever, a ler, a amarrar o tênis, a beijar... Você entendeu que as folhas balançam porque o vento as tocam... Você percebeu que um vento frio lhe tocou e gelou a pele... Você sentiu que a dor faz com que próximo a seus olhos lágrimas surjam... e nesse movimento existencial de influências constantes, você também ensinou/influenciou muitas pessoas! Você ensinou um filho, sobrinho, irmão, amigo... a caminhar, a andar de bicicleta, a escrever, a ler, a amarrar o tênis, a dançar... Você o auxiliou a entender que as folhas balançam porque o vento as tocam... Você o ajudou a perceber que se um vento frio lhe toca a pele, ele a gela... Você o promoveu a entender que a dor faz com que próximo a seus olhos lágrimas manifestem-se... Você e Eu... num processo de ensino-aprendizagem.

Portanto, como todos nós ensinamos, aprendemos e influenciamos o comportamento humano, atuemos criativa e não reprodutivamente sobre o que se aprende e o que se ensina, ampliando o que é ser-no-mundo, atentando-se à trindade.


*Artigo publicado originalmente no Jornal Tribuna Regional, 30 abr. 2010.


segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Para Uma Educação Ampliadora

A arte de ensinar é milenária. Seja no público ou no privado. Seja por pais ou titulados professores. As pessoas nos primórdios eram convidadas a refletirem. Anos se passaram e termos bem como conceitos foram ampliados e outros revogados: professores, em suas próprias palavras, não suportam presenciar alunos e nem estes àqueles.

Ouso perguntar: existe vida depois das aulas? Penso e vejo que não; apenas uma existência raquítica se mantém.

A instituição “atualmente” deixou a flexibilidade da práxis e passou a ser sintética. Tudo está pronto, industrializado e não se entende para que todas essas disciplinas. Há alunos que discutem entre si, bem como professores que fazem o mesmo; o pessoal e o profissional se alienam.

A maioria, dos professores está cansada. Reclamam dos salários vergonhosos, e de que os alunos não possuem respeito. Porém ouço também alunos dizerem o mesmo: há professores que não os respeitam. Já escutei discentes afirmarem que passam o dia numa jaula. Sim, são tratados como animais! Outros ou os mesmos professores, afirmam que há excelentes alunos; e outros ou mesmos alunos dizem que existem excelentes professores. Qual a queixa?

É evidente que não existem pessoas iguais. Logo, nas instituições educacionais, conviverão pessoas de diferentes etnias, culturas e valores, por horas, em um ambiente que se assemelha a um campo presidiário. Alguns são agressivos, outros quietos e outros ainda verborrágicos. O aluno e o professor tão esperados, aquele que entra magicamente pelo portal educacional, e ativa seu chip do conhecimento, não é vital; não há seres prontos; todos estamos em constante ampliação. Nesse sentido, é braçal o trabalho do professor de plantar sementes e cuidar para que germine.

Existem como afirmado, distintas pessoas num mesmo espaço; cada uma possui seus próprios valores e interesses que podem ser semelhantes e acabam construindo grupos. O professor tem que saber aproveitar a oportunidade e criar possibilidade de cada aluno atuar de sua forma, respeitando as outras atitudes. Existem os que falam mais e os que são retraídos, todavia ambos podem aprender o mesmo, depende de como as informações são transmitidas. Se em uma sala, o professor possui trinta alunos, ele tem que ser trinta possibilidades, para poder atender a todos. Todavia, os alunos também têm que existirem naquele espaço, em mesma quantidade possível, para poder compreender seus confluentes e respeitá-los. Isso se constrói, cria-se, possibilita-se.

Penso que a quantidade de alunos em “salas de aula” deveria ser gradativa do primeiro ao nono ano. É interminável a quantidade de alunos que seguem seus anos escolares sem serem alfabetizados, e os professores se justificam afirmando que existem muitos alunos e às vezes não conseguem atender a todos. Até a nona série, gradativamente, deveriam constar, por experiência, vinte e três alunos no máximo. No ensino médio, os números poderiam ser constantes, no máximo vinte e nove, visto que é um ambiente mais reflexivo e comunicativo.

Observo que, além da reorganização e da falta de real interesse educacional, as carências são de comunicação, respeito, amor e criatividade. Ser professor é ser criativo, é criar é recriar; é ser artista.

“Escritores da Liberdade” é um filme que estreou em 2007. Ele é baseado no aclamado best-seller “O Diário dos Escritores da Liberdade”. Para todos os envolvidos e sensitivos da educação, assistir é se emocionar; é surpreendente, a real história, vivida com garra e determinação de uma professora que teve que enfrentar sabia e amorosamente um sistema alienante, preocupado com a quantidade e não com a qualidade, para poder oferecer espaço, uma voz própria, a seus estudantes adolescentes criados no meio de tiroteios e da agressividade. Quando vai lecionar numa escola corrompida pela violência e tensão racial, a professora Erin Gruwell combate o sistema deficiente, lutando para que os discentes de sua turma façam a diferença em suas próprias vidas e não na lista classificatória do Sistema. Agora, contando suas próprias histórias, e ouvindo as dos outros, uma turma de adolescentes antes sem projetos descobrem o poder da tolerância, recuperando suas vidas desfeitas e mudando o seu mundo.

Numa instituição, durante o trabalho psicológico com grupos de alunos, foi impossível não notar, na maioria, o interesse por conhecer e por conversar. Dialogar sobre assuntos que os incomodavam era possibilitar espaço para novas apreensões, o que permitia também envolvê-los no contexto temático proposto. Sentiam-se livres, pois podiam falar, todavia aprenderam também a ouvir outros posicionamentos. Em sua maioria, eram alunos considerados perturbados, porém se demonstraram autênticos filósofos.

O Sistema é alienante. Seja no Ensino fundamental, médio ou universitário; particular ou público. Eles são destruidores e não construtores; visam a quantidade e não a qualidade. Portanto, cabe a todos plantar e cuidar de seu espaço educacional, não apenas na instituição, mas EM TODOS OS ESPAÇOS, certo de que todos são educacionais.

Ficar hora após hora, sentado, ouvindo, copiando, apenas virando páginas, trocando de apostilas e respondendo exames, bloqueiam o pensamento e a prática, por isso, há mais risco de ficar idiota convivendo com retardatários instituídos do que ser contaminado convivendo com enfermos que podem tranquilamente estar com outras pessoas.

Os estudantes e suas famílias, bem como os centros educacionais, sempre tiveram necessidades, mas seria excelente que eles pudessem ser ouvidos mutuamente e que houvessem, constantemente, espaços e interesse passa isso, e não um faz de conta.


segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Situações Familiares Privadas e Públicas

O Ser Humano é sozinho, único; ele se constituí no universo de forma inteira, até mesmo quando há a siamesiadade.

A privacidade é compreendida como a habilidade de uma pessoa em controlar a exposição de seus feitos, sejam dos de pensamento ou da prática; escolhendo a disponibilidade de informações acerca de si. É a capacidade de existir na sociedade de forma a construir o seu perfil, buscando ausência de julgamentos por interpretações de terceiros. Porém o privado em si é equivocado, pois ele está no público.

O público, referindo-se a situações pessoais, é tudo o que pode ser exposto à população, à coletividade e até mesmo levando à opinião pública.

A partir do momento em que se toma contato com o oxigênio, os pais criadores, ensinam muitas atividades a seus filhos criados, influenciando estes novos atores sociais a eles mesmos reconhecerem suas habilidades. Os pais dizem − afirmam eles que por preocupação − que se tem que lhes contar tudo, para que eles possam instruir seus pupilos corretamente.

Até o momento de minha existência, observando e contatando pais com seus filhos, ambos de todas as idades, percebe-se que a maioria, senão todos, reclamam de que seus filhos eram melhores quando eram menores e podiam segurá-los em seus braços. É justamente isso: o controle.

Quando se possuem bebês que choram e não andam, os pais os amam incondicionalmente, na maioria dos casos. Quando os filhos crescem, andam e iniciam a fala, bem como a reflexão e os famosos por quês, os pais não deixam de amar incondicionalmente seus filhos, mas, por serem entes unitários, e não um clone dos seus criadores, e por possuírem uma performance própria, muitas vezes, os filhos são condenados pela maternidade-maternagem e/ou paternidade-paternagem.

É difícil encontrar relacionamentos familiares em que os pais e filhos possuem um diálogo aberto, mencionando principalmente o amordaçado e presidiário tema de sexo e suas variáveis possíveis, tanto benéficas e maléficas. Muitos responsáveis precisam de auxílio externo, todavia divulgar isso é ser um cuidador biológico e judicial condenado publicamente; então, vivem na particularidade em muitos assuntos.

É digno de nota que, mesmo que seus filhos (se são pais que lêem), e mesmo que seus pais (se são os filhos que lêem) exerçam a possibilidade de conversarem sobre diversos assuntos, e de possuírem uma família modernizada – como muito se afirma −, mesmo assim, devido à particularidade e a publicidade, nem todos os assuntos, os pais, como maiores interessados, compreendendo-os ainda como democráticos (porém, até mesmo, com interesses de serem além de preocupados, controladores), conseguirão que seus filhos lhes informem tudo o que pensam, sentem ou até mesmo o que fizeram; principalmente porque nem tudo é verbalizável de imediato. O mesmo é verdadeiro para os filhos sobre os pais.

Conforme explana o professor inglês Eric Hughes, a privacidade é o poder de revelar-se seletivamente ao mundo; e de forma semelhante, o professor alemão Rainer Kuhlen expressou que a privacidade não significa apenas o direito de ser deixado em paz, mas também o direito de determinar quais atributos de si serão usados por outros.

O que instruo a pais e a filhos, independente da condição social, é serem pessoas de relação e confiantes na possibilidade da atitude um do outro; compreendendo a ambos como libertos, sendo autônomos e numa condição infinita do ser humano: independente-dependente.

Portanto, isso é viável, pois o ser é afirmativamente (auto)controlável, mas ele é também em contingências, agressivo e incompreensivo consigo mesmo e com o outro. É adequado que o ente ouça sugestões coerentes e não impostas. Nesse sentido, em situações familiares privadas e públicas, como afirma um provérbio chinês: o que seriam dos rios se não fossem as suas margens! Margens; e não câmeras de segurança.


segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

As Organizações do Trabalho

Existem vários estudos, produzidos ou que se encontram neste processo, que direcionam seus leitores a compreenderem, em algum momento de suas linhas, que vivemos para o trabalho.

Desde a infância somos alcançados por essa condição que permeia a existência vital humana; desenvolvemo-nos para trabalhar. Lembro-me de que com oito anos iniciei meus traços de trabalhos filosóficos; e em outros momentos, inventava: aquilo que possuía já pronto, os desfazia para poder criar.

Aproximadamente com uma quinzena de anos, passei a estabelecer uma conexão social com o trabalho, em que oportunidades não faltavam. Dizem que possuo o dom da inteligência, porém sei como criei uma habilidade diferenciada e entendo qual é o interesse humano. Desenvolvi-me em intensos anos exercendo e criando contabilidade, política e direito, além de outras pequenas inovações em trainee que, usando protocolos próprios, eximia-me de regras institucionais.

Atualmente as empresas querem empreender, todavia não entendem esse processo. No século XXI, utilizam-se do Treinamento, porém não entendendo o que ele significa. Buscam o lucro, mas se a empresa visa lucro, para este ser atingido, necessita-se, de gastos, este é o processo financeiro. O dinheiro é movimentável, ilude-se quem quer colocá-lo num cofre; ele não é um mero enfeite, é como o precioso anel da trilogia do Senhor dos Anéis: um instrumento que confere poder absoluto a quem o possuir, porém, há ainda as divergências internas e a influência corruptora do próprio anel ou, no caso, do próprio símbolo comercial.

Nestes rituais trabalhistas, em um de meus contatos e contratos, havia uma organização, que em meu primeiro ponto de vista era impressionante; ao entrar, tive a sensação de que era o local perfeito. Porém, aos passarem os segundos, minutos e horas, observando e sentindo o clima algo incomodava; estava colocando a perfeição em dúvida, simplesmente porque o design é uma maquiagem, usada para enfeitar o que não se deve mostrar; ali havia uma grande caldeira.

No diagnóstico organizacional se obteve muitos pontos que precisavam ser observados. Alguns meses depois, cada vez com uma conexão acentuada na instituição a dúvida se iniciava a obter respostas, visto que, por lógica, onde há o problema, também percorre a resposta.

Conversando profissionalmente com quase todas as dezenas de funcionários, a maioria, sobre a psicologia diziam que ela era importante. Frise-se que para a empresa era, duvidosa esta categoria profissional. Havia, portanto, a seguinte situação: uma empresa sutilmente amordaçadora, buscava o produto baseado num passado bagunçado, corrompia a criatividade dos funcionários (até mesmo sem perceber), havendo ainda um intenso processo de contratação-demissão, e alguns funcionários com possíveis situações iniciais ou intermediárias de lesões orgânicas.

O resultado momentâneo: falta de comprometimento e criatividade, pois utilizavam um trabalho produtivo e reprodutivo, permeado de design e uma tolerância pela necessidade de salário. Era como um motor de carro de 1929, num modelo do ano. Obviamente que não posso generalizar; havia poucos funcionários que eram criativos, e eram calados, tendo em vista que ouvi que todos devem parar de conversar e trabalhar mais; porém o projeto era reposicionar a psicologia, introduzindo-a no trabalho, estimulando a criatividade pela indagação, reflexão e experiência sensitiva (não dinâmica), em grupos, com o objetivo de pensar o trabalho.


[...] a linguagem é aquilo que, para todos nós, “poetiza e pensa”, bem antes do próprio indivíduo começar a pensar (Binswanger. “O Sonho e Existência”, 2002, p. 417).


A psicologia nas organizações quando aceitáveis são vistas como complementos, um adendo ao horário de trabalho que já é intenso. Ali, foi aplicada uma proposta em que a psicologia não invadiria espaços de almoço, pré ou pós-expediente; a psicologia, junto com outras atividades, eram momentos e faces do trabalho. O projeto grupal era uma experiência inovadora, porque apenas se fazem treinamentos e palestras: pura borracha teórica. O grupo, em suas diversas manifestações foi constituído para reflexão e planejamento de metas de resoluções, estimulando a criatividade e inovação, ofertando poder, não se eximindo da essência e dos valores empresariais, pelo contrário, intensificando-os; e como conseqüência, ramificando-os para as condutas pessoais, unindo o que estava disperso no interior do ser humano.


Cada vida é uma enciclopédia, uma biblioteca, um inventário de objetos, uma amostragem de estilos, onde tudo pode ser continuamente remexido e reordenado de todas as maneiras possíveis (CALVINO, 1990 apud ROSATO, 2005, p. 652).


Goethe sabia disso e muito melhor do que a maioria dos nossos psicoterapeutas contemporâneos. Lembre-se somente as palavras que ele põe na boca de Parmênides, em Os sábios e as gentes:


Adentre em si mesmo. Se não encontrares ai
O Infinito no espírito e nos sentidos
Nada no mundo poderá ajudá-lo.

(Binswanger. “O Sonho e Existência”, 2002, p. 444).


O desenvolvimento do trabalho foi magnífico; porém apenas aos olhos e atitudes dos funcionários e dos coordenadores das atividades. Foi possível realmente estabelecer uma práxis, fornicando a construção de um ideal pragmático e vanguardista para o ramo daquela instituição. Todavia, como exposto acima, por processos produtores e reprodutores, as portas criadas foram sutilmente fechadas, pois havia outros planos administrativos: não utilizar as portas, mas o alçapão.

Em muitos locais, o trabalho ainda é abusivo, com o interesse maquiado de um ofício como o início das fábricas industriais. Todavia, uma mão humana possui 27 ossos e dezenas de ligamentos, músculos e tendões. O cérebro é composto, além de outras células e órgãos, por cerca de 100 bilhões de células nervosas, conectadas umas às outras e responsáveis pelo controle de todas as funções mentais. As pessoas trabalham não apenas com as mãos, mas com o pensar, que as direcionam.

A atividade da psicologia, numa empresa, mesmo que como contratação, não é controlada pela gerência. Ela é parte e um dos guias da equipe; é como a lua e suas fases: na fase cheia, ilumina para observar, planejar e guiar em suas diversas metodologias, e na fase nova, com a escuridão, avalia, mas ainda está presente. Onde há humano, deve existir o psíquico, porque


[...] você dirige um carro. É uma máquina que você controla com o objetivo de chegar ao lugar que deseja: o carro o levará até lá. Todavia, não se dirige uma planta para fazê-la crescer. Da mesma forma, diríamos nós, os líderes não dirigem suas organizações. A organização é uma comunidade humana. É um sistema vivo, como o é uma planta ou um adolescente. Não há ninguém dirigindo-a. Mas há muitas pessoas cuidando do jardim (BRAGA FILHO, 2003, p. 13-4).


quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Você é Benévolo ou Assassino?

Ortotanásia, eutanásia e distanásia, são termos muito comuns na área relativa à saúde.

A primeira é um termo que define a pessoa que passa a ter uma ausência de vida, todavia de forma natural, isto é, sem interferências científicas; dizem que isso permite ao paciente o término vital sem sofrimento, sendo que se pode considerar que eram pessoas acometidas por doenças consideradas irrecuperáveis.

A segunda, a eutanásia, é um termo midiado, e possivelmente o mais conhecido, visto os casos europeus que repercutiram o mundo, mobilizando associações, religiões e o Direito. Ela é definida como uma prática em que se abrevia a vida de um paciente enfermo considerado como incurável, de forma controlada e praticada por um especialista, objetivando encerrar o sofrimento.

Por último, a Distanásia, é uma atividade em que também uma equipe médica e/ou familiares, decide continuar com a existência do paciente, relativa à área vital, por meios artificiais, mesmo considerando aquela pessoa como incurável, e que possua ausência de vida biológica.

Estes são assuntos todos relacionados ao fim da vida, mas como anteriormente discutido, não ao término da existência.

Resumindo:

Terminologia......Ortotanásia...........Eutanásia.............Distanásia
Vida Biológica.....Sim.......................Sim.......................Não
Paciente...............Irrecuperável.........Irrecuperável........Irrecuperável
Existência............Sim.......................Sim.......................Sim
Prática..................Natural.................Induzida...............Induzida

Por lei, o Estado tem como princípio a proteção e o direito à vida de todos os seus cidadãos, porém isso é a teoria; e por tudo isso, são termos que estão muito tempo em debates. O Estado não provê toda a assistência necessária; o que ele pratica sutilmente é uma ortotanásia?

Todas as três terminologias, aqui se apresentam, tendo como base a existência (infinita) e um ser humano considerado pela arte médica como incurável. Em dois (ortotanásia e eutanásia) possuem vida biológica, e em um (ortotanásia) pode-se dizer, em tese, que não há um interesse visível no bem estar da pessoa, pois em ortotanásia, haveria a possibilidade de se praticar beneficamente a eutanásia.

Considera-se, que o médico deve acompanhar as pessoas até seus últimos momentos vitais, garantindo-se uma qualidade de vida até o fim, todavia isso também seria uma Distanásia. Neste caso, a qualidade vital é dependente: pensa-se na medicina ou no enfermo?

São situações éticas, isto é, decidida por outros, complexas; aparenta, assim, ser a vida (mal)tratada, dentro da existência, como se fosse mediada por consertos e remendos, entre o aproveitável ou inaproveitável. E é assim, diante da vida de negócios e interesses, da qual estamos inseridos.

Françoise Dagognet, filósofo francês, amavelmente nos ensina:


Não vejo por que o homem deveria ser obrigado a sofrer um calvário no momento da agonia. No caso contrário, seria como voltar à natureza fetichista e mestra de nossas decisões. O homem não é aquele que pode dizer ‘não’, dominar o que é importante para ele? Por que obrigá-lo a se incluir diante do que ele pode atualmente tanto retardar – com as proezas da reanimação – como provocar?

O ser humano é poderoso e capaz. Ele deve decidir por suas atitudes. Todavia pessoas dependentes dos moribundos irão com lágrimas exclamar que não suportarão perdê-lo, pois se darão conta da importância que o outro possui na sua vida. Estas pessoas sentenciam não apenas que não verão essas pessoas, devido estarem biologicamente ausentes, mas que elas não Existem; apenas servem para um interesse pessoal. Se criassem em seu repertório o conceito de Existência, reconhecessem sua solidão e o estar com, provavelmente aprenderiam que 1+1=2; e que literal, constante e influenciavelmente na existência quer numérica ou pessoal, pode ser que 2+2=12.

Nesse sentido, já que a Existência é democrática e o ser é grandioso, até mesmo com suas dificuldades nas possibilidades, Você é Benévolo ou Assassino? Franz Kafka, escrito theco, expressou-se: “mate-me, senão você é um assassino”.


domingo, 24 de janeiro de 2010

A Hospitalização dos Profissionais

Historicamente, os hospitais foram construídos, intencionados como acolhida para proporcionar atenção a doentes e a peregrinos, durante a Idade Média.

Com o processo histórico o Hospital se tornou efetivamente uma instituição destinada ao atendimento de enfermos, bem como para proporcionar o diagnóstico e o tratamento necessário; sendo que a importância atualmente é possuir uma equipe multiprofissional, confiando-se em todos os profissionais, certo de que todos são importantes: limpeza, diretoria, administração, enfermeiros, médicos, psicólogos, entre outros.

Infaustamente, é escasso o número de psicólogos que trabalham nestas instituições, sendo que o ideal seria, no mínimo, um para cada setor, entendendo a realidade de que todos os setores são amplos.

Na ausência de profissionais contratados as instituições hospitalares geralmente contam com o fervoroso auxílio de novos profissionais integrados à equipe: os estagiários, que entram no campo prático, geralmente desnudando a teoria.

Obviamente que por ser um local em diversidade humana, com pessoas ímpares, e literais pacientes, que mesmo às vezes com semelhantes diagnósticos, são diferentes em intensidade e manifestação. Nisto, é significativo evidenciar que também é distinta a conduta de profissionais; há profissionais e Profissionais.

As instituições hospitalares possuem regras de conduta instruindo-se que todos devem segui-las. Porém as regras são estáticas e não prevê todos os acontecimentos e a intensa atividade humana. Por isso, sempre há, em todos os locais, quebras (ou ressignificações) de protocolos favorecendo interesses, sempre pessoais, e, raramente cumulado a terceiros. Frise-se de que as regras são teóricas e que sua prática criativa e embasada é dificilmente visível.

Havendo vários profissionais ou que teoricamente possuem essa titulação, há uma diferença entre um grupo destes e uma equipe, sendo que esta envolve Comprometimento.


Um grupo de trabalho é a união de duas ou mais pessoas que interagem umas com as outras e dividem algumas tarefas, visando objetivos inter-relacionados. Essas duas características, interação e inter-relacionamento, distinguem um grupo de uma simples união de pessoas. A distinção entre um grupo e uma equipe é importante; todas as equipes são grupos, mas nem todos os grupos são equipes. Um grupo consiste em pessoas que trabalham juntas, mas podem realizar suas tarefas sozinhas; já uma equipe é um grupo de pessoas que não podem realizar seu trabalho, pelo menos não eficientemente, sem os outros membros de sua equipe (Spector, 2006, p. 310-1).


Diante da realidade que se apresenta após casos e casos processuais midiados contra hospitais e profissionais e depois de poucos meses que entrei colaborando para Equipe de Psicologia Hospitalar, esteve sensitiva e praticamente clarividente todo o exposto.

Frente à realidade burocrática hospitalar, as pessoas (profissionais contratados, profissionais- estagiários e pacientes) são apenas números, e não vi de muitos, ou deveria afirmar de alguns dos mais importantes responsáveis, o comprometimento.

Foi como participar de uma propaganda política. No início houve o acolhimento, a expectativa considerando a psicologia como importante. Com o passar das semanas, surgiram boatos dirigidos, em que os psicólogos arrumariam as cadeiras e também auxiliariam a arquivar documentos, pressupondo que, nada ou pouco trabalhavam, ou quem sabe usam o instrumento verbal de forma demasiada e improdutiva.

Meses depois, defronte de uma crise mundial, estagiários comprometidos, desejavam retornar ao trabalho, “antecedendo uma semana da oficial”, sendo que não haveria problemas, pelo contrário, se tornaria enriquecimento aos pacientes, bem como pessoais aos profissionais. Foi perceptível que naquele primeiro dia de retorno, “não comunicado previamente”, o trabalho profissional foi grandioso; eles reencontraram as pessoas dos primeiros atendimentos, das quais possibilitaram favoráveis e surpresos feedbacks, demonstrando o quanto é importante uma escuta profissional. Os pacientes ficaram felizes em revê-los, mas não a equipe. Não puderam continuar nos outros dias. Adiantar uma irrisória semana (sendo que se não fosse a paralização educacional pela crise, seria aquela a semana oficial!) era algo inaceitável. Recentemente como parte da Equipe, mesmo conhecendo os detalhes, não entendi, no momento, o por quê!

Explicaram-me que o hospital não poderia se responsabilizar. Porém havia acordos de compromisso, assinados pelo hospital! Todavia, os estagiários observaram, ainda, rompimento de protocolos (regras), que até então não foram visíveis; regras modificadas, para interesses próprios. Mas não poderiam ser modificados autorizando o TRABALHO PROFISSIONAL por uma semana, pelos dedicados profissionais do estágio?! Alegou-se que não haveria supervisores. No entanto, analisando os fatos, nos papéis da instituição hospitalar alguém assina pela conduta deles! Refletindo para escrever este artigo, revivendo minhas memórias, sim, entendia o porquê: havia falta de comprometimento para com os pacientes que tanto alegres ficaram com o retorno. É obvio que mesmo estando na equipe, contestando e replicando, era inviável; não havia espaço para esta palavra mágica.

Participar daquele impotente momento foi como sentimentalmente analogizar com a seguinte história, aqui criada:


Era como ver duas crianças, irmãos, que numa metáfora, como siameses, e com seus 8 anos de idade, acordam. Estão no campo e olham de dentro de casa pela janela; vêem um céu azul e um brilhante sol, com uma temperatura agradável. Correm para seus pais e perguntam se podem andar de bicicleta pelo terreno. Ambos respondem imediata e simultaneamente que não. As crianças não entendiam; havia um dia lindo, os responsáveis registrados estavam ali. Passou-se aquele dia e não puderam criar, praticar, explorar, se auto-auxiliarem. Todavia, depois de um tempo, perceberam que também foi um momento de aprendizagem. Olhando entre si, observaram que não eram os interesses de seus pais praticarem sua infância, e mesmo por serem oficialmente seus responsáveis, eram profissionais-pais, que não sentiam o comprometimento por eles.


Do mesmo modo, no espaço hospitalar, em lástima, em primeira instância, as pessoas que se interessam, se comprometem, se respeitam e criam o amor, são os pacientes, que aos olhos de muitos profissionais (salvo poucos) devem ser geneticamente pacientes. Aprendi, mas sinto apenas de perceber e presenciar a conduta de muitos contratados e não profissionais, pois foram os contratados que obrigaram dedicados profissionais a absterem-se, por alguns dias, deixando, e possivelmente não reencontrando, os que os aguardavam pacientemente.


sábado, 9 de janeiro de 2010

As Dificuldades das Possibilidades




Quero regressar ao imaginário sem limites.
Tenho saudades dos sonhos a crescer
E da paz da profundidade
De tudo o que é possível.

Tenho saudades de mim,
De querer tudo e sorrir...
A imaginar que sim.
[s.a.]


O Imaginário é uma capacidade, um poder do ser humano, que lhe permite criar situações qualitativas, das quais pode representar sem que tais eventos tenham acontecido (para outrem).

As lacunas do imaginário são preenchidas pelas esperanças, que quando se solidificam pelo desejo humano, se estabelecem naquilo que poderíamos chamar de ilusão.

Ilusão é derivada do verbo latino illudo significando: divertir-se, recrear-se; mas também: burlar, enganar. O verbo latino estava formado pelo prefixo in- e o verbo ludo, "eu brinco". De ludo derivou-se uma ampla família de palavras na qual se inclui "lúdico", relativo a brincar; "eludir", escapar; "alusão", menção, referência; "interlúdio", intervalo num jogo ou representação teatral; e "prelúdio", o que precede uma representação. Em nossa língua, iludir se ampliou com o sentido de causar uma impressão enganosa ou possuir a esperança de algo desejável.

Criar eventos teóricos, mas não praticáveis, são os fatos que até hoje, em meu rol de atendimentos, mais se apresentou. As pessoas, cada qual com seus infinitos motivos, numa tentativa de compreensão, parearam transformando em sinônimos, as possibilidades com as esperanças, isentando-se das pragmaticidade.

Há alguns meses, quando eu estudava um livro sobre oncologia, lá continha um depoimento de uma paciente. Ela dizia que o câncer não passou a ser seu inimigo, mas a palavra possibilidade, pois na sua forma de compreender, a possibilidade de todos os eventos acontecerem, possibilitou a sua situação oncológica. Sim, isto é fato.

Teoricamente, a possibilidade é escrita e transmitida aos seus leitores como algo iluminado. Compreender que as pessoas são seres de todas as possibilidades se faz pensar o quanto grandiosas e divinas são as criaturas humanas. Ninguém não é magnificente; todas as possibilidades não são aquilo que desejamos e esperamos, mas o que universalmente estamos dispostos a praticar e, se for o caso, a receber (de nós mesmos).

Com isso, observa-se que as possibilidades possuem suas aparentes e ilusórias dificuldades, que podem ser assim compreendidas pelo imaginário do ser humano. No caso oncológico, e.g., devido ao sofrimento e o estigma do câncer, a pessoa experienciou uma das possibilidades de nossa atualidade e do universo. Porém, é importante aludir que, toda a possibilidade é algo que pode ser benéfica ou maléfica, depende dos seus repertórios de valores educacionais, compreensíveis e amorosamente inventados. Todas as situações, até mesmos as mais difíceis e sofríveis, são oportunidades (possibilidades) de se aprender, e também de criar eventos paralelos – bons ou ruins, porque um desses adjetivos apenas existe na presença irrevogável do outro.

Portanto, no momento em que o homem inventou a porta, criou a possibilidade de que as pessoas passem por ela, mas que também fossem por elas jogadas.





OBS.: Anterior a esta data, este espaço psicopragmático era nomeado Life Prostitute: A Prostituição do Conhecimento; ainda existente em sua essência.

sábado, 2 de janeiro de 2010

Senhores Deprimidos

Muitos seres devem saber, por experiência, que é difícil participar de lugares sociais que não sejam totalmente domados pela prostituição instituída, principalmente em vilarejos.

Uso com sarcasmo o verbete vilarejo. Uma das teorias é que o termo deriva-se do grego referindo-se aos aldios e aldias, ou seja, aldeãos e aldeãs; eles eram uma espécie de semi-servos, porém recuperaram quase totalmente sua liberdade; mas, o sarcasmo advém do fato de muitos se viver em vilarejos atualmente, sendo totalmente servos e sem nenhuma liberdade, acreditando que a tem. “Quando você é jovem, tudo parece o fim do mundo, mas não é. É só o começo”.

Nos vilarejos do interior ou metropolitano, a inexata idéia de liberdade e de pura escravidão é fantasticamente constatada nas danceterias, raves, pvts e festas diversas, onde o consumo exacerbado de álcool e drogas naturais ou sintéticas está alarmante causando preocupação de saúde pública.

O alcoolismo é comumente definido para pessoas que tenham um consumo consistente e excessivo de produtos que contenham o álcool, que também possuem conflitos no ambiente social e na saúde emocional, e até mesmo uma predisposição genética para ocorrência do fato. Tal manifestação sempre interfere acentuadamente na vida pessoal, familiar, social e profissional da pessoa causando alterações psíquicas e físicas, bem como paralisação dos sinais vitais por diversas condições consequenciais diretamente do abuso alcoólico.

Além do álcool, existem outras drogas. Elas estão classificadas em três categorias: as perturbadoras, as estimulantes e as depressoras; todas relacionadas às ações mentais. O termo é amplo e envolvem barbitúricos, tranquilizantes, alucinógenos, estimulantes e analgésicos, bem como o citado álcool e demais substâncias de fácil acesso, podendo ser naturais ou sintéticas.

Em geral, drogas (também conhecidas como entorpecentes e narcóticos) são termos que se referem às químicas que geram modificações nos sentidos, em que as psicotrópicas, molestam o Sistema Nervoso Central (SNC), alterando as faculdades comportamentais e psíquicas.

Por aproximadamente quatro anos, acompanhei um grupo de dependentes químicos. Foi uma contribuição mútua. Em seus relatos, podíamos observar, juntamente com seus sentimentos, a alienação causada pelos componentes químicos. Todos podiam relatar suas experiências, sejam elas pessoais ou profissionais. O dialogar imperava e auxiliava no suporte psíquico. Ali participavam os adictos, familiares, acompanhantes, os coordenadores e o público em geral interessado na temática. Em sua maioria, eram pessoas consideradas pela sociedade, como ignorantes, todavia eu não as substituía por um tratado médico; este apenas me auxiliava como complemento. Possibilidades diversas nós compartilhamos e as aproveitamos.

Como relata uma música internacional, “[...] os tigres vêm à noite, com sua voz baixa como o trovejar [...]”, e geralmente, é à noite que os tigres químicos vêm, com sua voz persuasiva, encantando, os adios e adias que se dizem modernos. Ainda escravos, estes visitam casas noturnas (ou até mesmo diurnas), apenas para comparecerem e se exibirem; alienados, também pelo hedonismo, não se sentem, são desprovidos de atividades mentais regulares e não criam seus próprios espaços; unicamente, caminham como autômatos programados, dispensando possibilidades de práxis existenciais, em outras localizações em que possam usá-los adequadamente para criar diálogos como senhores fidedignos de existência, e não como subservientes de indiferentismo moral, político, sócio-cultural e intelectual, isto é, promovidos com distração.

Nestas situações de existência que impera na sociedade, agora instruídos por Facundo Cabral – compositor, cantor e escritor argentino –, lembre-se que


Não estás deprimido, estás distraído. Distraído em relação à vida que te preenche. Distraído em relação à vida que te rodeia: golfinhos, bosques mares, montanhas, rios. Não caias como caiu teu irmão que sofre por um único ser humano, quando existem cinco mil e seiscentos milhões no mundo. Além de tudo, não é tão ruim viver só. Eu fico bem, decidindo a cada instante o que desejo fazer, e graças à solidão [...] Não faças o que fez teu pai, que se sente velho porque tem setenta anos [...] Não estás deprimido, estás distraído. Por isso acreditas que perdeste algo, o que é impossível [...] Além disso, a vida te tira coisas: te liberta de coisas. Alivia-te para que possas voar mais alto, pra que alcances a plenitude. Do útero ao túmulo, vivemos numa escola; por isso, o que chamas de problemas são apenas lições. Não perdeste coisa alguma [...] Não existe a morte... apenas a mudança [...] Não faças coisa alguma por obrigação ou por compromisso, apenas por amor. Então terás plenitude, e nessa plenitude tudo é possível sem esforço, porque és movido pela força natural [...] Reconcilia-te contigo, coloca-te frente ao espelho [...] e decide neste exato momento ser feliz, porque a felicidade é uma aquisição. Aliás, a felicidade não é um direito, mas um dever; porque se não fores feliz, estarás levando amargura para todos os teus vizinhos. [...] Podemos experimentar a neve no inverno e as flores na primavera, o chocolate de Perusa, a baguette francesa, os tacos mexicanos, o vinho chileno, os mares e os rios, o futebol dos brasileiros, As Mil e Uma Noites, a Divina Comédia, Quixote, Pedro Péramo, os boleros de Manzanero e as poesias de Whitman; a música de Mahler, Mozart, Chopin, Beethoven; as pinturas de Caravaggio, Rembrandt, Velázquez, Picasso e Tamayo, entre tantas maravilhas. [...] Não estás deprimido, estás desocupado. [...] Ama até que te tornes o ser amado; mais ainda converte-te o próprio Amor. [...] O bem é maioria, mas não se percebe porque é silencioso. Uma bomba faz mais barulho que uma carícia, porém, para cada bomba que destrói há milhões de carícias que alimentam a vida [...]

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